29/12/2009

Chocolate



É domingo. São sete horas da manhã. Pernas realizam movimentos com parcimônia e levantam-me. Roupas estão jogadas aqui e acolá, acusando minha rotina de todo sábado à tarde. Nesse dia, o sexo é uma prática inevitável e, na verdade, gostaria que fosse inevitavelmente diário.
            Cheiro de café invade minha residência. Sua fumaça sobe como cheiro de calmante incenso às minhas narinas. Ao lado, o modem da internet está com problemas; queimado; de novo. Mas e daí? Hoje não é dia de me contaminar com cheiros desgostosos.
            Cheguei em casa às treze e vinte. O sábado estava mais ensolarado que nunca. Brilhava acima e sobre os telhados; iluminando a todos, do mendigo mais imundo ao empresário mais higiênico. Não escolhe, ele não.
            A casa estava um lixo, como sempre. Moradia masculina que se preze tem pelo menos uma cueca pendurada num local que todos a possam admirar. Em minhas mãos pairavam outros dedos, sem pêlos, claros e delicados. Eram os dela e eu a puxava pra dentro.
            Roupas outras num átimo começaram a voar. Sutiã rodou no ar como um bumerangue que não sabe o caminho de voltar. As outras peças, minhas e dela, só caíram.
            As pernas dela se enroscaram, braços se prenderam e movimentos suados deram início à esperada tarde de sábado. A atividade fora tão intensa, a cama ficara tão ensopada que era impossível dormir, cabia ali só a tentativa de não afogar. Ficamos parados; olhando para o teto como se o patamar de prazer se fizesse "enxergável" além da alvenaria. Depois, virados em meia-lua, cheirei a nuca despelada, enquanto tentava pentear alguns fios de seu cabelo com barba grossa e mal-feita. A casa agora emanava perfume, suor, intensidade e mulher.
            "Vamos fazer brigadeiro?", disse a voz feminina ansiosa por glicose. Concordei com a cabeça e caminhamos como Adão e Eva pelo paraíso de cuecas e outras vestimentas entulhadas em direção à cozinha. Gás, pólvora queimada, fogo. A panela esquentou e quatro mãos se revezaram ao misturar os ingredientes do chocolate caseiro. Bolinhas de serotonina. Prazer, dessa vez de origem culinária. Comemos a sede e bebemos sua morte, água e brigadeiro, uma combinação incomparável.
            As pálpebras do dia se fecharam. O sol se foi e junto com ele foi ela. O gosto dela em minha boca não é tão veemente quanto agora é seu cheiro em minha casa. Sua essência faz-me lembrar e acreditar que é, sim, possível encarar a cruel realidade como se todos os dias tivessem tanto o sabor quanto o cheiro do delicioso chocolate de sábado. Obrigado.

Por H. O.


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